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FUNÇÃO PÚBLICA, VALORES, IGUALDADE E COMUNISMO

 

No dia 10 de Agosto de 1999 entrei na Alfândega de Milão às 12h.45 para levantar uma mala. Das 3 ou 4 pessoas presentes duas liam o jornal. Uma delas era o chefe da secção. Disse-me que tinha que vir no dia seguinte e trazer um impresso modelo IM. Disse-lhe que habitava longe de Milão e perguntei-lhe se não poderia fazer isso durante a tarde. Disse-me que não porque teria de procurar o impresso, prenchê-lo, etc., e não haveria tempo durante a tarde.

Depois de várias tentativas para compreender porque teria de voltar no dia seguinte cheguei à conclusão de que ele queria continuar a ler o seu jornal e não se queria incomodar. Exaltei-me e só não fiz um escândalo porque a minha companheira me acalmou. Perguntei-lhe onde poderia adquir o impresso e se não poderia encontrá-lo perto. Disse-me que não, que teria de procurar na "Piroli" ou "Fuffeti", (duas cadeias de negócios).

Parti de carro com a minha companheira que trabalha a Milão e conhece bem a cidade. Passámos a tarde toda à procura do impresso. Por fim começámos a telefonar a todos os negócios onde ainda não tínhamos estado mas entretanto era hora de fecharem e partimos de Milão sem o impresso.

No dia seguinte depois de procuras em vão lembrei-me de telefonar à "Italfrigo", a empresa privada onde estava depositada a mala, mesmo por baixo da Alfândega de Milão. Disseram-me que o tinham e mo davam.

Enquanto me dirigia para a Alfândega de Milão fervia de revolta e tentava conter-me para não ir preso por ofensa a público oficial. Pensei começar com bons modos e dizer-lhe que estava para criar um jornal Internet de ideias para um mundo melhor e gostaria de lhe fazer uma entrevista porque deveria saber como melhorar a função pública para não se perderem dois dias para levantar uma mala nem perder meio dia à procura de um papel.

Pensei mesmo começar por perguntar-lhe como tinha sido a sua carreira profissional e tentar descubrir quanta corrupção ou incompetência estaria por detrás. Por várias vezes tinha tentado encaminhar-me para um despachante ao qual não me soube dizer quanto pagaria.

Quando cheguei à Alfândega de Milão não vi ninguém a ler o jornal, o incompetente não estava e fui atendido por um gentil senhor que me encaminhou para outro igualmente gentil que me ajudou e em poucos minutos estava a sair dali para ir levantar a mala.

Recordei passagens pelos antigos paízes comunistas em que as burocracias só funcionavam com gorgetas em dólares. Recordei quando fiz mais de mil kilómetros só porque um empregado do tribunal de Milão não me quiz dizer ao telefone o contacto de um tradutor oficial de Português. Recordei horas numa bicha da "questura" (polícia ) de Milão para ser informado de que aquela bicha era só para entregar papeis e tinha de passar mais umas horas na do lado para levantar o meu papel. Recordei bichas que começavam às 8 da noite para poderem ser atendidos às 8 da manhã. Passei horas em bichas com gente que passava ali a noite toda à chuva e ao frio de Inverrno. E cada 15 dias, para cada novo contrato, tinha que passar 2 vezes pelo martírio de passar horas intermináveis nas bichas sem dormir.

Na Suiça pagava mais pela documentação mas não sofria como em Itália. Eu e a maioria daquela gente que passava aquelas horas nas bichas preferíamos pagar quaquer preço para evitar aquele sacrifício. Se pagássemos mais poderiam dar trabalho a mais desocupados e evitar as bichas. As leis e burocracias na Suiça são mais lógicas e funcionais. As emprezas públicas funcionam melhor. Talvez porque existe outra mentalidade, menos corrupção e maior intolerância da incompetência.

Itália está sempre na primeira linha das ajudas humanitárias mas as suas burocracias são muitas vezes desumanas. Os mais honestos sofrem as consequências e a fama dos menos honestos. Não é justo que sofram uns pela corrupção ou incompetência dos outros. Não é justo que um incompetente e mau que passa o tempo a ler o jornal e a impontar o trabalho para outros ganhe o mesmo de outro honesto e competente. A função pública deve encontrar meios de premiar os melhores e castigar os piores. Devem existir livros de reclamações em todos os departamentos públicos, números de telefone, direcções e "e-mails" onde se possa reclamar e dar sugestões para o bom funcionamento dos serviços públicos.

Stefano Parisi, Director Geral do "Comune"(Câmara) de Milão, diz que gastará uma fortuna para limpara as paredes dos "grafits". ("Spenderemo 30 miliardi in tre anni per ripulire le facciate degli stabili del Comune." In: "Famiglia Cristiana" n. 32/1999, p.19). Não seria mais útil gastar esse dinheiro para uma limpeza moral da cidade? Não seria melhor premiar aos mais honestos e eficientes empregados da função pública, assumir desempregados, deminuir as bichas e o mau funcionamentos dos serviços públicos? Esses "grafits" não serão uma forma de arte ou expressão artística de determinada cultura?

CASM, AA