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CUSTOS SOCIAIS DA PUBLICIDADE E O DIABO VESTIDO DE ANJO

Quase toda a publicidade tem custos sociais, isto é, prejudica de alguma forma a sociedade. Mas de uma forma geral esses custos sociais são contrabalançados com benefícios sociais: na rádio e na televisão rouba o tempo de escuta mas compensa com informações que até podem ser úteis, até pode ser divertida e sobretudo paga os meios para a sociedade receber gratuitamente outros benefícios. Na imprensa escrita os custos sociais são mínimos, excepto quando é o Estado, isto é, os mais honestos contribuintes, a pagar o papel ou a publicação. Por outro lado, os benefícios sociais da honesta publicidade impressa, em geral podem ser grandes: oferecem ao consumidor meios de informação e divertimentos gratuitos ou quase, (Cf.: LPA: PUBLICIDADE, DEUSA E DEMÓNIO DA SOCIEDADE DE CONSUMO - APRESENTAÇÃO).

A publicidade só se torna pérfida e imoral quando é mentirosa, engana a sociedade e lhe causa mais prejuízos do que benefícios. E é moralmente pior quando se veste de anjo e de bons princípios para trágicas consequências. Vejamos alguns exemplos:

Durante a guerra do Kosovo as televisões italianas repetiram vezes sem conta emocionantes stops publicitários a pedir ajudas para as vítimas da guerra através de uma organização humanitária oficial italiana. A 20 de Agosto rebentou o escândalo: "Panorama" revelou que  dos 2.300 containers cheios de ajudas para o Kosovo, 1.250 se encontravam inutilizados e abandonados dois meses e dez dias depois do fim da guerra. No final de Agosto no porto de Bari encontravam-se 920 contentores com coisas a apodrecer por permanecerem meses sem serem entregues. E dos 350 entregues só 44 tinham sido abertos porque os responsáveis tinham ido de férias e outros não tinham autorização para dar o conteúdo aos miseráveis da guerra. (Cf.: "PANORAMA" Agosto e Setembro, "LA STAMPA", 31.08.99, p.10).  O escândalo reacendeu-se a 24.09.99 com a divulgação de um video que mostrava a polícia da Albânia a roubar os containers. Mais de metade das ajudas para o Kosovo foram roubadas pela mafia albanesa. De facto sempre foi melhor aproveitado o que foi roubado do que o que apodreceu nos containers. Pouco depois surgiram outros escândalos de centenas de toneladas de roupas da "Caritas" encontradas numa descarga da "camorra", (organização mafiosa italiana).

Imagino que esta publicidade ou era gratuita, ou paga pelos contribuintes através do Estado, ou era paga pela organização com o dinheiro das ofertas. De qualquer das formas todos os cidadãos italianos perderam tempo, (e talvez dinheiro), muitos sofreram a frustração de saberem que as suas ofertas não tinham servido para nada . Naturalmente que se uma organização não tinha meios de fazer chegar as ofertas aos destinatários não as devia  pedir, sobretudo num meio potente como a televisão num momento em que se transmitiam imagens tão dramáticas da guerra, explorando a sensibilidade dos telespectadores . Apresentando-se com objectivos divinos teve diabólicas consequências inclusive para essa organização que perdeu prestígio perante a opinião pública.

Uma peça de teatro era tão má que saiu de cena após as primeiras apresentações. Uma televisão do Estado, com as dívidas do fim do ano pagas pelos contribuintes, continuou a transmitir publicidade a essa peça durante semanas. Todos os telespectadores perderam o seu tempo a escutar uma mentira, aqueles que se deslocaram ao teatro perderam o seu tempo para depararem com as portas fechadas e todos os mais honestos contribuintes pagaram para um meio precioso que em vez de ser útil era prejudicial.

No pequeno cinema do Palácio Foz  em Lisboa passavam ciclos de cinema com entradas muito económicas que se esgotavam sobretudo com estudantes de poucos recursos e determinados interesses culturais. Após o 25 de Abril de 1974 muitos meios de informação em Portugal passaram para o Estado. Um burocrata da Função Pública de qualquer ministério passou a poder introduzir nos jornais publicidade e fez grande publicidade ao pequeno cinema. Resultado: fazia-se uma bicha de mais de uma hora ao meio dia para uma única sessão de umas 100 pessoas às 20 horas. As 100 pessoas que viam o filme em vez de perderem 10 a 30 minutos antes para comprarem o bilhete, como acontecia antes da publicidade, passaram a perder horas em transportes e bichas pois tinham de se deslocar duas vezes ao local do cinema. Milhares de pessoas deslocaram-se ao local quer antes do cinema começar, (como faziam antes da grande publicidade), quer à hora de abertura da bilheteira deparando-se com uma bicha de 100 pessoas e sem hipótese de comprar bilhete.

Este burocrata disse-me todo orgulhoso: fui eu que fiz o grande êxito do Palácio Foz. Eu perdi o meu tempo duas vezes para tentar ver dois filmes. Milhares de pessoas perderam o seu tempo como eu por causa de uma publicidade. Estes burocratas da Função Pública não terão consciência dos custos sociais das bichas e das deslocações? Se o pequeno cinema já esgotava sem publicidade porquê desperdiçar este precioso meio para prejudicar tanta gente?

Atendendo a que a publicidade tanto pode ser um bem como um mal social, proponho a criação de normas universais que tornem a publicidade mais útil e menos prejudicial para a sociedade. A própria publicidade pode tirar as suas vantagens: tornando-se uma actividade mais prestigiada, mais digna de crédito, mais respeitada e por conseguinte mais atractiva para os seus profissionais e para os utentes. Por outro lado pode tornar-se mais efectiva com menos meios. Como primeira norma proponho a proibição da mentira e da publicidade eenganosa. Tribunais de bom senso regionais, nacionais e internacionais deveriam poder aplicar multas em benefício das vítimas concretas ou da sociedade em geral quando os danos fossem gerais ou difícil identificar e indemnizar as vítimas. Um tribunal  internacional especializado deveria velar pela publicidade via Internet. Os paízes que não aderissem a essas normas internacionais e causassem prejuízos com vigarices via Internet deveriam ser castigados e pressionados a indemnizar os danos ou ao menos condenados moralmente pela opinião pública internacional.

LPA: PUBLICIDADE, DEUSA E DEMÓNIO DA SOCIEDADE DE CONSUMO - APRESENTAÇÃO.

LJMI, AA.